Do crescimento sincronizado à desaceleração assimétrica?

Em apenas um ano o panorama da economia mundial passou das luzes às sombras. Isto aconteceu entre o arranque de 2018, que até começou bem, com um vigoroso crescimento simultâneo nos principais blocos económicos, Estados Unidos, Europa e China fundamentalmente, e o princípio de 2019, já marcado pelos primeiros sinais de que os sintomas de esgotamento começaram a ser percetíveis em muitas economias, e pelo medo de que esses mesmos sinais conduzam a uma desaceleração, se não sincronizada pelo menos assimétrica.

São, inclusive, cada vez mais os “agoirentos” que se atrevem a pronunciar a palavra maldita - recessão - alentados pelos ajustes nos mercados financeiros na reta final do ano passado, bem como pelos piores dados macroeconómicos a nível global, o que muitos interpretaram como o prelúdio da crise económica.

Felizmente, estes sobressaltos abrandaram um pouco e, para isso, contribuiu uma resposta mais tranquilizadora por parte da Reserva Federal, que mostrou uma predisposição para ser "paciente" perante as futuras subidas dos juros, e também do BCE, determinado a voltar à normalidade monetária de uma forma muito pausada, e ainda pelas melhores expetativas de que as negociações comerciais entre Estados Unidos e China podam chegar a bom porto.

O cenário de recessão que pode atormentar os investidores a curto prazo parece, assim, improvável, à boleia do ainda notável ritmo de crescimento mundial, apesar de muitas vozes apontarem em sentido contrário. Já o economista Paul Samuelson costumava ironizar dizendo que "os mercados previram nove das últimas cinco recessões".

Mas a verdade é que a economia tende a piorar e seria ingénuo ignorar que as incertezas económicas e políticas permanecem. São, como no filme de Bryan Singer, os "suspeitos do costume", ou seja, a guerra comercial entre os Estados Unidos e China, o medo do impacto de um Brexit abrupto e as tensões que emanam do auge dos populismos e dos partidos antissistema. Tudo usto aumenta, compreensivelmente, a inquietude sobre a intensidade e o ritmo da desaceleração.

Então o que podemos esperar? São muitas as incertezas que planam sobre as nossas cabeças e todas suscetíveis de piorar. Além disso, convém não esquecer que estamos sentados sobre uma bomba de dívida. Quando, em 2007, estalou a crise financeira, a dívida total equivalia a 2,1 vezes o PIB mundial – a mais alta da história-; agora, essa dívida total representa já 2,4 vezes o PIB mundial. O FMI não deixa de recordar que a acumulação de dívida é a grande ameaça à economia mundial, sobretudo a acumulação de dívida pública. Pelo que outra crise como aquela, de semelhante magnitude, iria encontrar-nos sensivelmente mais vulneráveis e com muito menos força monetária para a combater.

Mas para já, não vale a pena entrar em pânico. O cenário mais previsível é que todas estas incertezas continuem a ser uma realidade, mas que acabem por não se materializar, dissipando-se com o tempo. Refiro-me a um cenário em que as negociações comerciais entre Estados Unidos e China transitem por uma senda de responsabilidade para evitar danos no comércio e no investimento e sejam suficientemente frutíferas para relaxar a tensão; um cenário em o que se evite um Brexit abrupto; um cenário em que os bancos centrais sejam consequentes com a "paciência" com a qual se comprometeu a Reserva Federal na normalização da sua política monetária; um cenário em que as autoridades chinesas têm êxito com as suas medidas regulatórias para favorecer uma aterrizagem suave da economia; um cenário em que após um ano de complicadas eleições para o Parlamento Europeu, os populismos não tenham força suficiente para erodir os cimentos da UE e causar tensões irreparáveis na economia...

Em definitivo, um cenário de alguma calma mesmo instável e de um crescimento razoável, embora cada vez com maiores diferenças entre países. Ou seja, uma desaceleração assimétrica.

Juan José Garrido, Chefe de Redação da Expansão

Juan José Garrido é jornalista especializado em informação económica. Licenciado em Ciências da Informação pela Universidade Complutense, começou a trabalhar no Diário de León. Desenvolveu a sua carreira profissional no diário Expansão, onde é hoje Chefe de Redação de Economia/Política e de Opinião. Colabora em debates televisivos e meios escritos especializados em economia com artigos de opinião.